quarta-feira, 26 de setembro de 2012

A História do Futebol Feminino no Brasil


 
As histórias sobre o início do futebol feminino no Brasil são marcadas por inúmeras controvérsias e dúvidas. Pesquisadores indicam que o primeiro jogo aconteceu em 1921, em São Paulo, sendo disputado por jogadoras paulistas e catarinenses.

Matéria publicada em uma edição do Jornal do Brasil do dia 29 de novembro de 1976 sugeria que as primeiras partidas de futebol feminino nas praias do Rio de Janeiro ocorreram no Leblon, um ano antes. De acordo com o jornal, os jogos eram sempre disputados no período da noite, porque grande parte das jogadoras trabalhavam como empregadas domésticas. Infere-se, portanto, que as classes menos favorecidas economicamente são as responsáveis pelo início desse esporte no Brasil, ao contrário do futebol masculino, modalidade exclusiva das elites brasileiras, nos anos iniciais.

Uma das edições da Revista Veja de 1996 afirma que os primeiros campeonatos de futebol feminino no país teriam sido organizados por diferentes boates gays, no final da década de 70.

O certo mesmo em relação a estas histórias é que as atletas brasileiras sempre foram e sempre serão verdadeiras guerreiras, pois enfrentam o machismo e o preconceito desde a primeira vez em que calçaram uma chuteira e foram chutar uma bola de futebol.



Fotos das jogadoras do Araguari Atlético Clube (MG) - Extraída do blog
http://teresacriscunha.blogspot.com/


Machismo e preconceito
Os papéis sociais determinados para homens e mulheres são distintos no mundo predominantemente patriarcal em que vivemos. Em cada época, procurava-se determinar quais os esportes seriam adequados para as mulheres. Determinadas expressões relacionadas aos aspectos corpóreos eram classificadas nas opções como “femininas” ou “não-femininas”. E o futebol, sem sombra de dúvidas, ficava no rol da segunda opção.
Um dos grandes absurdos foi protagonizado no ano de 1964 pelo ex-presidente Castelo Branco, logo no início da ditadura militar no Brasil. A resolução 7/65 do Conselho Nacional de Desportos (CND) simplesmente proibiu a prática do futebol feminino no país. O decreto também vetou a participação das mulheres em competições de lutas, pólo aquático, rugby, baseball, entre outros.

Foi somente em 1981, que o CND revogou a proibição impedindo as mulheres de jogarem futebol.

Durante o período do Estado Novo, na década de 40, o então presidente Getúlio Vargas também instituiu um decreto lei que criminalizava a participação das mulheres no futebol. Nesta época, existiam no Rio de Janeiro times formados por mulheres do subúrbio com nomes sugestivos como Cassino Realengo e Eva Futebol Clube.

Na década de 40, o futebol feminino era organizado em torneios e exibições de gala das mulheres do subúrbio carioca, causando uma enorme discussão entre médicos, jornalistas, populares, professores, intelectuais e o próprio presidenteGetúlio Vargas. Afinal de contas, diziam os mais conservadores, correr atrás de uma bola era negar o papel de mãe responsável pela geração de uma “nova raça”.

Durante o Estado Novo, Getúlio Vargas e sua ‘Medicina Eugenista’ (preocupada com o “melhoramento da raça”) dominou o campo da Educação Física e com ela procurava definir quais tipos de movimentos, exercícios e cargas físicas as mulheres podiam vivenciar, objetivando ausências de lesões, especialmente nos órgãos de reprodução. Tomando como base essa “cientificidade”, Vargas estabelece a primeira Legislação Esportiva Nacional, que proibiu o futebol feminino no país.

As competições de futebol feminino voltaram a ocorrer a partir dos anos 80. Em 1981, foi criada a primeira liga de futebol feminino do Rio de Janeiro. Também nasceu na cidade maravilhosa o Radar F.C., um dos grandes times brasileiro de futebol feminino, que conquistou inúmeros títulos nacionais e internacionais.



Os deuses do futebol foram injustos novamente. Seleção brasileira fica com a medalha de prata em Pequim 2008, assim como aconteceu nas Olímpiadas de Atenas, em 2004. Nas duas ocasiões, as brasileiras perderam para os EUA no jogo decisivo

Na década de 80, diversas empresas começam a se interessar comercialmente pelo futebol feminino. Jogos são transmitidos pela televisão, fato que contribui enormemente para iniciar a popularização do esporte pelo Brasil.

O primeiro time
Fundado no dia 16 de novembro de 1944, o Araguari Atlético Clube, sediado nas Minas Gerais, iniciou as atividades com o futebol feminino em 19 de dezembro de 1958. É considerado o primeiro time oficial do Brasil formado somente por mulheres, de acordo com reportagem de janeiro de 2009 do programa Esporte Espetacular, da Rede Globo, e também de matérias da Rede Record. Todos esses produtos jornalísticos foram feitos com a ajuda dos materiais fornecidos pela pesquisadora mineiraTeresa Cristina Cunha, que estuda as origens do futebol feminino no país.

A história das mulheres do Araguari começa quando a direção do Grupo Escolar Visconde de Ouro Preto propõe ao diretor do clube mineiro a realização de uma partida beneficente contra os atletas do maior rival, o Fluminense Futebol Clube, com o intuito de arrecadar dinheiro para o colégio. Um dos diretores do Araguari, Ney Montes, sugeriu então que fosse realizada uma partida de futebol entre as mulheres da cidade, ao invés do clássico com os times dos homens, que não estavam com muita moral com o público local. O sucesso foi total. Milhares de garotas queriam fazer parte do time.

O jogo ocorreu com casa cheia no Estádio Vasconcelos Montes, que hoje funciona como um estacionamento de supermercado. O Araguari venceu o Fluminense por 2 x 1. Como sempre, a alegria das jogadoras de futebol foi interrompida por mais um ato de preconceito dos “mandatários” do esporte no país.


Clique aqui e aqui e assista reportagens com as pioneiras do futebol feminino em Araguari e no Brasil

Clique aqui e leia uma reportagem publicada pela Revista O Cruzeiro, em 1959, repercutindo o futebol feminino.

Vergonha! Clique aqui e leia a carta que um cidadão enviou ao então presidente Getúlio Vargas implorando para que as mulheres fossem impedidas de jogar futebol no Brasil.


No final de 1959, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) proibiu a prática do futebol entre as mulheres, por considerar a modalidade por demais violenta. A medida interrompeu uma sequência de 11 meses nos quais as atletas do Araguari vinham treinando com intensidade e realizando diversas partidas. 

Alguns dos principais pioneiros no incentivo ao futebol feminino em Araguari são Ney Montes, Isolina França Torres e Mário Nunes. A cidade de Araguari se situa a 585 km de Belo Horizonte e possui cerca de 111 mil habitantes. É o terceiro maior município do Triãngulo Mineiro.



Um dos pioneiros
Um dos clubes de futebol feminino mais antigo do Brasil é o Saad Esporte Clube. O time foi fundado no dia 28 de abril de 1961 pelo empresário Felício José Saad, na cidade de São Caetano do Sul.

A história de pioneirismo do Saad começa após a decisão da diretoria do Guarani FC (SP) em encerrar as atividades da sua equipe. Romeu Castro e Mara Villas Boas, ex-dirigentes do Bugre de Campinas, procuraram o Saad e pediram para que Felício apoiasse o time de futebol feminino. O empresário atendeu ao pedido dos dirigentes e permitiu a abertura de uma sub-sede na cidade de Campinas.

Saad conquistou dezenas de títulos em competições, em diversas categorias, como o Troféu Brasil (1989), o hexacampeonato da Copa São Paulo (1990 a 1995) e o Campeonato Brasileiro de 1996. Foi a principal equipe brasileira na década de 90. O clube iniciou também os trabalhos com as categorias menores do futebol feminino.

Em 1993, a equipe de São Caetano do Sul dava mostras de que caminhava a passos largos para a profissionalização do futebol feminino ao oferecer um piso salarial mínimo de 100 dólares mensais às atletas. Neste período, o clube teve de enfrentar o preconceito da Federação Paulista de Futebol, que não permitia a inscrição de atletas ou equipes de futebol feminino na entidade, impedindo o Saad de participar de qualquer competição oficial no país ou exterior.

A solução encontrada pelos dirigentes do Saad para manter vivo o sonho das atletas do futebol feminino foi recorrer àFederação de Futebol do Mato Grosso do Sul, que na época era presidida por Ari Rodrigues.

Com o apoio da federação sul mato-grossense, foi criado um departamento autônomo com sede na capital do Estado, Campo Grande. Desta forma, o Saad e as suas atletas puderam se registrar junto à Confederação Brasileira de Futebol. Vários títulos conquistados pelo time foram divididos com o Estado do Mato Grosso do Sul.

Em 1997, a Federação Paulista derrubou os seus próprios fantasmas e criou a I Paulistana, em parceria com a empresaSport Promotion. Outro fato que demonstra o pioneirismo do Saad ocorreu em 1998, quando a equipe resolve investir na popularidade que o futebol feminino começa a obter nos Estados Unidos e firma um convênio com a National American University, abrindo oportunidades imensas para o intercâmbio de atletas e demais profissionais do esporte.



Jogos Olímpicos
Em 1996, o Comitê Olímpico Internacional (COI) incluiu o futebol feminino nos Jogos de Atlanta. A seleção dos Estados Unidos ganhou a medalha de ouro. O Brasil terminou em quarto lugar, mesma colocação que obteve na Olimpíada de Sydney, em 2000. Em Atlanta, atletas baianas como Sisi, Roseli, Elaine e Formiga fizeram parte do grupo da seleção.

Nas Olimpíadas de Atenas, em 2004, o Brasil conquistou a medalha de prata, perdendo a final para os EUA. As alemãs ficaram com o bronze. Quatro anos depois, nos Jogos da China, as jogadoras brasileiras também fizeram brilhante campanha, mas novamente não conseguiram superar as americanas no jogo final e terminaram com a medalha de prata.

O mundo reconhece o talento das atletas brasileiras. A atacante Marta coleciona três títulos consecutivos da Fifa de melhor jogadora do mundo. Ganhou o título de Rainha Marta. 

Sem apoio e sem reconhecimento profissional no Brasil, Marta foi disputar a Women's Professional Soccer (WPS), a liga de futebol feminino dos EUA. Lá, logo recebeu diversas homenagens, como a criação de uma boneca com o seu nome, além da denominação ‘Marta's Maniacs’ (Maníacos pela Marta) para uma ala de um estádio da Califórnia.
Pan Americano

Em 2007, no Pan Americano disputado no Rio de Janeiro, a seleção do Brasil conquistou a medalha de ouro, com um show de Marta, após golear os EUA por 5 x 0 no jogo final, com o Estádio do Maracanã lotado, com mais de 60 mil pessoas. As jogadoras brasileiras conquistaram o torneio invictas, com seis vitórias em seis jogos disputados, sem sofrer nenhum gol.

Também em 2007, as canarinhas ficaram com o vice da Copa do Mundo, disputada na China. A final foi contra a Alemanha. As campeãs também aplicaram uma goleada de 11 x 0 contra a Argentina, uma das maiores na história da Copa do Mundo feminina.
Liga Feminina
Em 2007, pressionado pelo presidente da FIFA, Joseph Blatter, que exigiu a criação de uma Liga de Futebol Feminino no Brasil, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, organizou o primeiro torneio oficial para as mulheres, a Copa do Brasil de Futebol Feminino, vencida pelo time do Saad Esporte Clube, de São Caetano do Sul, no estado de São Paulo.

No dia 1º de novembro de 2008 teve início a segunda edição da Copa do Brasil, com a participação de 32 equipes. Como a divulgação do regulamento e da tabela somente foi feita a 15 dias do início do torneio, diversas equipes não puderam se inscrever, principalmente porque tiveram pouco tempo para conseguir os quase R$ 10 mil necessários para entrar na disputa. As duas edições da Copa não tiveram apoio nem da mídia nem de patrocinadores.

As equipes do São Francisco do Conde, Fluminense de Feira e Clube 2004, respectivamente o campeão, o vice e o terceiro colocado do Baianão 2007, abriram mão da única vaga da Bahia na Copa do Brasil, por falta de recursos. O representante do Estado no torneio foi a Associação Desportiva Lusaca, do município de Dias D´ávila, que foi quarta colocada no Campeonato Baiano de Futebol Feminino 2007.   

Na Copa do Brasil de Futebol Feminino 2008, as jogadoras dos três melhores times foram premiadas com inscrições para o Bolsa-Atleta em 2009, programa do governo federal que paga salários entre R$ 300 e R$ 2,5 mil para atletas de destaque em modalidades esportivas. 

Como o futebol feminino ainda é um esporte amador, a maioria das atletas brasileiras não recebe salários. Alguns clubes fornecem ajudas de custo como transporte, serviços médicos ou bolsa auxílio de cerca de R$ 500, na melhor das hipóteses.



A atacante Marta é a melhor jogadora do mundo, de acordo com duas eleições feitas pela Fifa.

Clique aqui e assista grandes jogadas da Rainha Marta

No mês de outubro de 2009, as garotas do Santos Futebol Clube conquistaram a primeira Copa Libertadores da América de Futebol Feminino, que teve jogos transmitidos ao vivo pela Rede Bandeirantes de Televisão.

Entre os meses de outubro e dezembro de 2009, foi disputada mais uma edição da Copa do Brasil de Futebol Feminino, com 32 equipes e as presenças de Marta e Cristiane, duas craques da Seleção Brasileira, que jogaram pelo Santos. Como ocorreu nas outras edições, a CBF eximiu-se de promover a competição, que passa despercebida pela maioria dos torcedores. A imprensa se limita a informar sobre os jogos decisivos ou os resultados dos representantes locais, no caso da mídia regional.

De acordo com os dados da CBF relativos ao ano de 2007, cerca de seis mil mulheres praticam oficialmente o futebol feminino no Brasil.

Sem sombra de dúvidas, este número é muito maior. O futebol feminino é um esporte amador, ainda. Portanto, é muito grande a quantidade de mulheres que praticam o esporte, mas não são registradas em nenhuma federação esportiva estadual e na própria CBF. 

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Bobby Charlton diz que futebol feminino já foi ridículo mas progrediu rápido


Londres, 1 ago (EFE).- O ex-jogador Bobby Charlton, considerado uma lenda no Reino Unido, destacou nesta quarta-feira os progressos do futebol feminino, que segundo sua opinião já 'foi ridículo', mas que evoluiu consideravelmente.
Charlton chegou a dizer que ao ver as partidas da competição feminina de futebol nos Jogos Olímpicos por vezes esquece que são mulheres que estão jogando.
'Às vezes tenho que lembrar para mim mesmo que não estou vendo uma partida de homens. O jogo delas está mais organizado', comentou o ex-jogador do Manchester United.
Sir Bobby Charlton reconheceu que no passado era 'muito cético' com o futebol feminino. 'Foi um erro. Não devia ter desvalorizado as mulheres. O futebol feminino foi ridículo, mas não é mais. Progrediram muito rápido, estou muito impressionado', disse.
'Talvez elas não possam competir fisicamente, mas possuem as mesmas habilidades dos homens', acrescentou Bobby Charlton, que ressaltou as virtudes da equipe britânica.
'Foi uma surpresa fantástica vê-las competir em alto nível contra o Brasil e conseguir vencer. Nunca pensei que veria o dia em que 70 mil pessoas assistiriam a uma partida feminina em Wembley', comentou. EFE